segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Escola Quilombola do Vale do Ribeira celebra o Dia da Consciência Negra

   Antes de escrever este texto acabei pensando em como o faria utilizando o impessoal; no entanto, concluí que não há como fazê-lo. O último dia 18, sexta-feira, foi histórico para a Escola Estadual Maria Antonia Chules Princesa. A unidade escolar conseguiu reunir alunos de diversas escolas do município para uma manhã repleta de atividades educativas de diversos gêneros como Sarau, lançamento de livro, teatro, declamações, danças, músicas entre outras.
A Chules, como carinhosamente é chamada a escola, atende estudantes de 7 comunidades quilombolas: André Lopes, onde está  localizada, Sapatú, Nhunguara, Ostra, Galvão, Ivaporunduva e São Pedro.Quando se está envolvido na realização das atividades não há como relatá-las em terceira pessoa. Pois bem, o evento iniciou-se com a palavra da Diretora Josemira Gouvea que deu as boas vindas e disse sobre a importância de sua realização e da data não só para o nosso povo negro, mas a tod@s. Em seguida li o texto "Consciência negra ou consciência humana?” buscando fazer reflexão sobre a importância de falarmos em Consciência negra e não em Consciência humana, pois ao usarmos o segundo termo estamos indiretamente negando toda a luta e reflexão proposta para esta data.

Alunxs do primeiro e terceiro anos do Ensino Médio (EM) arrasaram declamando poemas e cantando Rap de autoria delxs realizados nas aulas de Língua Portuguesa e Literatura, História, sociologia e com apoio da Sala de Leitura. A maior parte dos poemas encontra-se no Livreto Poemas, primeiro da coletânea Negro tem história, que foi lançado no ano passado. Neste evento foi lançado o segundo volume, intitulado Nossos contos quilombolas, produção que traz histórias que foram contadas por diversos membros das comunidades e reescritos pelos alunos.  Vozes DÁfrica, de Castro Alves, foi declamado pelas alunas da segunda série do EM e o Rap “Ainda há desigualdade ”, escrito e cantado pelos alunos do 8º Ano do Ensino Fundamental também foram bem aplaudidos pelos presentes.

E pra completar a sequencia, a aluna Bruna Marinho da Silva, que ficou entre as melhores do município na Olimpíada Brasileira de Língua Portuguesa recitou o poema de autoria dela mesma, intitulado “Trilha do ouro”. A estudante da Rede Municipal de Ensino e recebeu homenagem pelo patamar alcançado.

Uma adaptação de “Navio negreiro”, de Castro Alves foi encenada pela 3ª Série/EM e outra peça foi apresentada por estudantes do 1º ano. Intitulada Bernardo Furquim, a encenação apresentou um pouco da vida desse ícone das comunidades da região. Conhecido por ter várias mulheres em vários lugares, a história de Furquim justifica que tal fato era para que as terras quilombolas fossem povoadas por seus descendentes; já que era negro liberto, então se fortaleceria e fortaleceria a todo o seu povo com o povoamento.
O evento teve duas presenças especiais: Gabriela Romeu, jornalista, documentarista e roteirista do documentário “Disque Quilombola” e Penélope Martins escritora e narradora de histórias, que encantou a todos contando “Panela do Rei Xangô”. Crianças e jovens ficaram com olhos fixados nela durante toda a apresentação para não perder um só detalhe da narrativa realizada pela escritora que veio exclusivamente para o evento.
Teve também Hip-Hop, apresentado por alunxs da EE Boa esperança; Maculelê, demonstrado pelas escolas municipais quilombolas; Danças Pérola Negra, Raça negra e outras danças afro realizadas por alunxs da própria Maria Antonia Chules Princesa. E jamais poderia me esquecer da bela apresentação dos usuários da APAE- Eldorado, que mais uma vez demonstraram exemplos de superação.  
Os visitantes puderam ver salas com mostra de maquetes de cada quilombo e com a exposição “O olhar quilombola para si”, projeto de fotojornalismo baseado em imagens capturadas pelos próprios alunos de diversas paisagens, lugares e pessoas das comunidades em que residem. Já o encerramento ficou por conta do Grupo Cultural Puxirão Bernardo Furquim; grupo formado por crianças e jovens que praticam a capoeira. Muitos deles são estudantes das EMEF Quilombo São Pedro, Galvão, Ivaporunduva e André Lopes, e outros pertencentes a unidade escolar que sediou celebração.
Prestigiaram o evento: Noel Castelo, representante da Casa Civil do Governo do Estado de São Paulo; Gabriel Spinula, Dirigente de Ensino da Região de Registro; Margareth Porto, Supervisora de Ensino; Durval de Morais- Vadico e Dinoel Rocha, Prefeito e vice, eleitos para os próximos anos; representantes dos Núcleos Pedagógicos da Diretoria de Ensino da Região de Registro; Roseli Silva, representando o Núcleo de Formação Profissional Quilombo André Lopes- ETEC- Centro Paula Souza; Josias Moreira, do Quilombo Sapatú; Adilson oliveira, Quilombo André Lopes; Aurico Dias; Quilombo São Pedro; Antonio Jorge, Quilombo Pedro Cubas; Marina Soares, Quilombo Nhunguara; Setembrino Marinho, Quilombo Ivaporunduva; Valéria Silva, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo; Ademar da Silva Jardim, Diretor do Departamento Municipal de Educação da Educação da Estância Turística de Eldorado; gestores das escolas municipais e estaduais de Eldorado e Gestoras da EMEIF José Maciel da Silva, do Bairro Castelhanos, município de Iporanga-SP. O evento contou ainda com a presença de alunxs das Escolas Odette Pereira Goulart Sales, Jayme Almeida Paiva e Boa Esperança, além das municipais de todas as comunidades 
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Vale lembrar que as atividades relacionadas a temática da Educação Escolar Quilombola ocorrem no ano todo  e se intensificam no mês de novembro. Os alunos tiveram um bate-papo sobre “Cabelo, identidade e autoestima da pessoa negra” com as Professoras Dra. Viviane Marinho Luiz e Pós-doutoranda em Educação Márcia Cristina Américo; em outra ocasião conversaram sobre “Direitos das comunidades quilombolas” com Rodrigo Marinho (EAACONE/MOAB) e Adilson Oliveira, graduando em história, das comunidades de Ivaporunduva e André Lopes, respectivamente. Além disso, estiveram na unidade escolar José Rodrigues da Silva, explanando sobre Construção de Hidrelétricas no Vale do Ribeira e os universitários Wesley Silva, Luiz Eduardo Dias e Dener Silva, do Quilombo São Pedro falando sobre opções de acesso a universidade.
  Vivenciamos sobretudo, uma crescente autoestima das crianças e jovens quilombolas, bem como o sorriso na face dos docentes nos mostra satisfação e sensação de dever cumprido. Porém, espera-se que o Poder Público (todos os setores), ali na mesa representado tenha captado a mensagem de que celebrar o Dia da Consciência Negra não é pra se festejar e sim refletir... Não é esquecer da merenda que as vezes falta, não é esquecer do ônibus que quebra ou que deixou de ir buscar nossos jovens para fazer o ENEM 2016; não é esquecer da falta de Internet (ou acesso precário) desde a fundação da escola há 10 anos, não é esquecer que a escola em questão não tem telefone e está em uma região onde não tem sinal de telefone celular; não é esquecer da Lei de Parques sancionada pelo governo do estado, que dificultará a vida das comunidades cujo parque está ao redor delas; não é esquecer de que os professores e professoras deste município e também os/as do estado tiveram pouquíssimos  momentos de Formação sobre as Leis 10639/03, 11645/08 e Resolução 08/12; não é esquecer que o município é um dos maiores produtores de banana da região, mas a fruta não está presente na alimentação escolar; não é esquecer que uma ETEC foi construída e está praticamente abandonada no quilombo; não é esquecer da lentidão no processo de demarcação de terras quilombolas; não é esquecer que nosso povo negro sofre racismo até hoje em muitos lugares; não é esquecer que Zumbi dos Palmares foi assassinado ao não se render ao sistema imposto... 20 de Novembro é pra reflexão... 













Fotos: Professos César Relva
Mais fotos em: https://www.flickr.com/photos/144800733@N06/sets/72157672868514664/page4/ (Diretoria de Ensino de Registro)

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